sábado, 28 de novembro de 2015

Sarau Gente de Palavra Transoceânico - Coimbra

Coimbra, 26 de novembro, noite fria e linda, noite em que ocorreu, no inspirador Salão Brazil, o primeiro sarau Gente de Palavra longe das terras brasileiras: Sarau Gente de Palavra Transoceânico.
O evento foi uma parceria do Salão Brazil e da Revista Gente de Palavra e reuniu um público com mais de setenta pessoas. Houve microfone aberto a com leitura de poemas autorais e de poetas como Carlos Drummond de Andrade, Vinícius de Morais, Fernando Pessoa, Agostinho Neto, entre outros. Para tornar a noite mais colorida, a poesia dividiu espaço com a música através da interpretação de canções brasileiras e inglesas. Além disso, o músico João Camões acompanhou com seu violino a leitura de alguns poemas, um casamento perfeito entre som e palavra.
Brasileiros, portugueses, italianos e espanhóis marcaram presença no evento, que primou por compartilhar a arte sem fronteiras. João Rasteiro, Pires Laranjeira, Filipe Furtado, João Camões, Tom Barreto, Amanda Gomes, Fernanda Lacombe, Felipe Loureiro, Fábio Lucindo estão entre os nomes que trouxeram música e poesia para o palco do Salão Brazil.
A cobertura fotográfica ficou a cargo de Tom Barreto e as imagens podem ser conferidas na íntegra na página do Facebook da revista.

Michelle C. Buss
Fotografia: Tom Barreto

Filipe Furtado
Fotografia: Tom Barreto

Pires Laranjeira
Fotografia: Tom Barreto

Felipe Loureiro
Fotografia: Tom Barreto

Tom Barreto
Fotografia: Fábio Lucindo

Amanda Gomes
Fotografia: Tom Barreto

João Rasteiro
Fotografia: Tom Barreto

Fernanda Lacombe
Fotografia: Tom Barreto

João Camões
Fotografia: Tom Barreto

Salão Brazil
Fotografia: Tom Barreto

Vitória Paes
Fotografia: Tom Barreto

Fábio Lucindo
Fotografia: Tom Barreto




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Evoé
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sexta-feira, 27 de novembro de 2015

As flores de plástico não morrem


Foto: Amanda Gomes

O vinil é um meio de as pessoas se presentearem com músicas.
Aquele pedaço de papel cartão que mede 30cm x 30cm carrega artes gráficas desenvolvidas cuidadosamente, desde a capa até o encarte, os quais são finalizados através de um processo quase totalmente científico, não fosse a poesia que está intrínseca nas imagens impressas. O disco é como uma flor embrulhada, cujo papel estampa fotos, cores e nomes, mas também pode servir de base para muitas declarações (sejam elas de amor ou não).
No terceiro andar da Galeria Chaves, um dos prédios veteranos da Rua dos Andradas, situada no centro histórico de Porto Alegre, existe um espaço dedicado a esses objetos, cujo valor está presente não só em sua materialidade, mas também no conteúdo: as canções que pairam na imensidão do tempo. Para os amantes dos discos, tanto clássicos como obsoletos – que podem se tornar descoberta fabulosas –, visitar a Tamba Discos é como passear pela própria infância e juventude, ou mesmo desvendar épocas que não foram vividas. Na pequena sala, há milhares de álbuns, pendurados nas paredes e dispostos nas prateleiras, que já emocionaram muitas pessoas e estão prestes a emocionar o próximo comprador ou o seu destinatário. 

Foto: Amanda Gomes

A Tamba Discos possui diversos álbuns que marcaram décadas e gerações. Tristes ou alegres, algumas músicas têm o poder de acessar memórias e trazê-las à tona como um tufão, varrendo todos os pensamentos que encontram pela frente e ativando apenas uma cena, um gesto, um olhar, um sorriso, um sentimento, uma vontade. A música transgride as regras do tempo. Através de apenas uma nota, pode-se reconhecer o que foi a trilha sonora de uma história. Se o arranjo inicial pode remeter imediatamente ao todo que compõe a melodia responsável por embalar uma fase da vida, o refrão é capaz de deixar o coração em frangalhos e os olhos mareados, acelerando a pulsação e fazendo-nos mergulhar nas lembranças. 

“Desde criança eu tenho familiaridade com a música, os discos sempre estiveram à minha volta através da coleção que era do meu pai.” 

Michel Munhoz, de 37 anos, é bem mais do que o atendente da Tamba Discos que vende LPs e CDs novos e, em sua maior parte, usados. Ele é amante e profundo entendedor de música. Apaixonado por rock in roll, ele já fez parte de bandas do gênero e segue desenvolvendo trabalhos musicais em estúdio para diversos fins. Por isso, suas vidas pessoal e profissional são atreladas à música. “A música, além de fazer parte do meu trabalho aqui na loja, está presente nas atividades que desenvolvo fora daqui e que também geram parte da fonte do meu sustento”, destaca Munhoz. 

“Antes de trabalhar na Tamba Discos, eu já frequentava esse lugar há mais de 20 anos.” 

Há cinco anos, o musicista conduz o empreendimento que muito frequentou na juventude. Ele relata que, quando o dono da Tamba Discos estava precisando de alguém que conhecesse a loja e as sutilezas que ela possui para nela trabalhar, logo surgiu o interesse de Munhoz em ocupar vaga sugerida. “Isso era para ter durado cerca de seis meses, só para quebrar um galho, mas ainda estou aqui”, ele vibra. Enquanto seu colega de trabalho e proprietário do comércio vai em busca de vinis que possam ser revendidos por eles, Munhoz se preocupa em atender o público cativo do lugar e indicar os álbuns que se aproximam do gosto musical de cada um. “A faixa etária que costuma procurar nossos produtos vai dos 20 aos 80 anos, nosso público é muito variado”. Munhoz conta que, assim como a idade dos clientes, os gêneros musicais procurados por eles são abrangentes. Embora o forte da loja sejam os álbuns de rock in roll e pop, os discos de música clássica, Música Popular Brasileira (MPB), jazz e orquestras também são requisitados. 

Foto: Amanda Gomes
 
“O disco que mais me pedem é o Tropicália ou Panis et Circenses, mas faz tempo que ele não passa por aqui.” 

Gravado em estúdio, com composições e interpretações de Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil, Nara Leão, Os Mutantes e Tom Zé; dos poetas José Carlos Capinam e Torquato Neto e do maestro Rogério Duprat, o disco Tropicália ou Panis et Circenses foi lançado em julho de 1968. Símbolo máximo do que significou o movimento tropicalista, idealizado musicalmente por Caetano e Gil, a obra sintetiza as angústias e ambições da geração que viveu o final dos anos 1960 e início da década de 1970. Munhoz diz que relíquias como essa são raras de se ver no mercado e, quando são encontradas, o preço é bastante alto (podendo ultrapassar R$ 100).

 “O disco que eu considero um verdadeiro patuá da loja é do Daminhão Experiência.”

O bilhete junto ao disco demonstra a admiração
do pessoal da loja por Daminhão, que é considerado por eles
o "pai" da música experimental.
Foto: Amanda Gomes

Munhoz relembra que várias pessoas já quiseram comprar o álbum, mas ele sempre fez questão de ressaltar que o disco não estava à venda. “Os conterrâneos do Daminhão Experiência (nascido no Rio de Janeiro), ou quem teve oportunidade de conhecer o trabalho dele, se virem o disco vão querer leva-lo”, decreta o musicista. “Um cliente carioca, que chegou a conhecer o Daminhão, veio aqui na Tamba e contou sobre a história do artista, super interessado em comprar o LP, mas eu não vendi não”, ele ressalta. De acordo com Munhoz, o próprio Daminhão teria gravado seu LP de modo artesanal em sua casa. “Se tu escutares esse disco, verás que ele tem muitas músicas experimentais”, alerta o atendente. Segundo ele, o mais curioso sobre Daminhão, que ainda é vivo, é que o artista começou a produzir seus próprios discos nos anos 1970, após se aposentar da Aeronáutica, e a tocar nas ruas de Botafogo. “Esse cara é uma lenda urbana do Rio de Janeiro”, exclama o musicista. 

“Em primeiro plano, o que é mais especial no vinil é a sua sonoridade.”

Para Munhoz, a sonoridade do vinil é única. “O som do LP é analógico, não é como um compact disc, cuja sonoridade é totalmente esterilizada e a reprodução parte de uma leitura binária. O vinil não, experimenta escutar a intensidade dos graves, a musculatura do som, a fricção do acetato da matéria vinílica”, ele pontua. O musicista fala ainda sobre a maneira adequada de se apreciar um vinil: “Como a agulha faz a reprodução do som pelo contato com o LP, através do sistema analógico, ela também capta sons externos, por isso o ambiente pode ajudar ou atrapalhar a escuta do ouvinte”. O método de gravação da voz e dos instrumentos das canções no plástico do disco é um processo físico. Os sons ficam guardados nas ranhuras pelas quais passeia a agulha. “O caminho que a agulha percorre não é linear, ela oscila, muda de nível, e o próprio vinil balança à medida que ele gira e faz a música tocar”, reflete Munhoz ao descrever um objeto atemporal. 

“Ler um encarte é como folhear um livro.” 

Conforme Munhoz, é isso que prende a atenção das pessoas e faz com que elas sintam necessidade de pegar o vinil na mão, examinar os detalhes das imagens, folhear o material, dar uma olhada na ficha técnica. É como ler um livro: ao manusear o disco a gente imagina as coisas, viaja ouvindo o álbum e, ao mesmo tempo, tem o contato com ele”. Ele conta que alguns discos chegam na loja em estado deplorável. “Nós fazemos um trabalho criterioso para receber LPs de boa qualidade. Não adianta o disco ser raro e seu estado de conservação estar péssimo”, ele pondera. 

Foto: Amanda Gomes

“Eu lembro de um disco do Zé Ramalho, que tinha uma dedicatória enorme dentro, com assinatura e data de 1978, mesmo ano de lançamento do LP.” 

Acompanhando o universo das trocas que uma loja de artigos usados promove há bastante tempo, Munhoz relembra algumas histórias curiosas de remetentes e destinatários que são eternizadas nas capas e nos encartes dos discos. “Quando fiz a leitura do texto, notei que a pessoa estava com o sentimento à flor da pele para dar aquele disco de presente, mas não percebi se ela queria desfazer o relacionamento ou reatar, porque o sentido das frases era dúbio”, narra ele. O musicista diz que já vendeu esse LP e que, quando o cliente se interessou pelo material, ele fez questão de mostrar a dedicatória, temeroso de que isso impedisse o negócio. “Daí o cara me disse: ‘Nossa! Eu vou levar esse disco, eu preciso levar esse disco’, e eu pensei: Poxa, que legal, ele leu e gostou”. Para o músico, a graça das dedicatórias é que elas são encontradas de surpresa. “Eu não separo os discos que têm dedicatória dos que não têm, e cada vez que a gente se depara com uma, a novidade é inevitável”.

 “O disco é a passagem do tempo.” 

Quando se está gravando e produzindo, desenvolve-se um trabalho de registro. De acordo com Munhoz, gravar um álbum é como fotografar: “O que é prensado e gravado no disco, vai estar ali eternizado”. Segundo ele, um LP possui uma durabilidade muito grande. O musicista afirma que as gravações de um CD, por exemplo, podem sumir em um período muito mais curto do que as de um disco de vinil. “O vinil tem essa atemporalidade”, reitera ele. Conforme Munhoz, ao fazer uma canção, o compositor pode tratar de um tema que deve ficar datado, como a ditadura militar no Brasil, ocorrida na década de 1960, por exemplo. “Tem vinis que possivelmente servem como objetos de pesquisa de determinada época, funcionando como um arquivo da cultura”, acrescenta ele. Quando pergunto sobre a música que traz boas lembranças aos próprios ouvidos do musicista, ele diz que essa pergunta, feita dentro de uma loja de discos, é difícil de ser respondida. Concordo com ele, mas insisto que certamente existe uma letra que marcou uma fase de sua vida. Então, Munhoz posiciona uma das mãos no queixo e começa a olhar para a parede repleta de capas, até que encontra o álbum Ocean Rain, da banda inglesa Echo and the Bunnymen, de 1984. 

Michel Munhoz com um dos seus discos favoritos.
Foto: Amanda Gomes


“Neste disco tem uma música que eu gosto muito e me lembra esta mesma loja há uns 20 anos, quando eu comecei a trabalhar nela e este disco estava exposto. Na época eu o comprei e ainda ouço.” 

Sete Mares (Seven Seas) 
Echo And The Bunnymen 

Apunhale um coração arrependido
Com o seu dedo favorito
Pinte o mundo inteiro de azul
E pare as suas lágrimas de remorso
Ouça o canto dos trogloditas
Boas notícias eles estão trazendo

Sete mares
Nadando-os tão bem
Contente de ver
A minha face entre eles
Beijando o casco da tartaruga

Um desejo
Por uma nova sensação
Pertencimento
Ou apenas ajoelhar-se eternamente
Onde está o sentido no roubo
Sem a graça de ser ele

Sete mares
Nadando-os tão bem
Contente de ver
A minha cara entre eles
Beijando o casco da tartaruga

Queimando minhas pontes
E destruindo meus espelhos
Voltando para ver se você é covarde
Queimando as bruxas com mãe religiosa
Você acenderá o fósforo e me banhará
Em jogos aquáticos
Lavando as rochas abaixo
Ensinado e amansado
A tempo com fluxo de lágrima

Sete mares
Nadando-os tão bem
Contente de ver
A minha cara entre eles
Beijando o casco da tartaruga

Sete mares
Nadando-os tão bem
Contente de ver
A minha cara entre eles
Beijando a tartaruga

Sete mares
Nadando-os tão bem
Contente de ver
A minha cara entre eles
Beijando o casco da tartaruga


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Evoé
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terça-feira, 24 de novembro de 2015

Sarau Gente de Palavra Transoceânico




Atravessando os mares e chegando às terras lusas, Gente de Palavra em parceria com o inspirador espaço, Salão Brazil, e organização de Michelle C. Buss, realizam o Sarau Gente de Palavra Transoceânico. 
Um pouquinho da poesia contemporânea brasileira e portuguesa colore o espaço do evento, criando um momento para compartilhar também a poética e a música de outros recantos do mundo. É poesia e música sem fronteiras, poesia e música que atravessam oceanos, montanhas, cidades, que pousam nos corações, palpitam nos lábios e nos corpos. Poesia e música que voam livre, que são vida e se reinventam.
O sarau terá microfone aberto, então, traz teus escritos, traz tuas músicas, ou de artistas favoritos, traz amor e vem compartilhar, construir esse momento especial e de muita arte.

Presenças poéticas e musicais confirmadas:

Amanda Gomes
Felipe Loureiro
Fernanda Lacombe
Filipe Furtado
João Rasteiro
Michelle C. Buss
Pires Laranjeira
Poetas do Amanhecer
Tom Barreto

Confira o trabalho de Tom Barreto, que fará a arte fotográfica do evento:



Quando: 26/11/2015
Onde: Salão Brazil
Horário: 22 horas
Entrada: Gratuita




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 Evoé
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segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Medo e amor

Se te desejo tal qual um arauto
Teus olhos verdes me põem numa cela
Te quero envolto em meu ardente abraço
Me queres doce e com assaz cautela

Não pensas tu que és meu amor primeiro
Meu sangue ferve e já me ponho nua
Antes de ti, calor e fogareiro
Não esqueças que nem sempre fui tua

Amanda Gomes

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Evoé
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quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Análise do filme O Homem do Pau-Brasil

Capa do DVD do filme O Homem do Pau-Brasil

A percepção que a maioria tende a ter perante um filme como O Homem do Pau-Brasil tende a ser negativa, visto que ele aborda – de modo totalmente experimental – vários aspectos polêmicos, originais e conflitantes entre si. Conforme explica Walter Benjamin, o convencional é apreciado acriticamente e o que é uma representação genuína do novo, com aversão. Assistindo ao filme, o espectador, que está habituado a uma narrativa cinematográfica linear clássica (holiwoodiana), sente a provocação do enredo através do frenesi da sucessão de imagens carregadas de teatralidade, além de diálogos e falas complexas. Esses fatores possibilitam que haja um "ruído" na comunicação do diretor do filme com o espectador, ao ponto que, para Luis Martino, há comunicação quando duas consciências se comunicam e compreendem a mesma mensagem. 
A obra cinematográfica, que retrata a introdução do Modernismo no Brasil através de uma de suas figuras mais importantes, Oswald de Andrade, é minada de peculiaridades. Uma delas é justamente o fato de Oswald ser representado por dois atores ao mesmo tempo: um homem e uma mulher. Essa é a tentativa de evidenciar o lado masculino e o lado feminino do artista. A dificuldade inicial de compreender o filme pode estar vinculada à estranheza que sentimos ao ver Oswald, uma pessoa física, sendo representado por duas pessoas ao mesmo tempo. Isso se deve ao fato de que a representação conjunta pretende dar conta da personalidade de Oswald, ou seja, representá-lo como um objeto formal, e não apenas o corpo físico como objeto material. 
Como afirma Foucault, pensar é um ato de violência. Não há como pensar no meio termo, pensar é se auto-afirmar de algum lado. Os modernistas, por sua vez, sustentavam seus pensamentos contraculturais através da auto-afirmação frequente que praticavam. Eles se propuseram a pensar e discordaram, em vários âmbitos, do sistema vigente na arte, na política, na igreja. Portanto, produziram diferença ao se comunicarem, querendo desconfigurar e desnaturalizar as coisas. No longa-metragem, há uma predominante comunicação verbal, e esse tipo de linguagem foi fundamental para que o movimento prosperasse. Algumas falas eram reproduções de importantes obras da época como, por exemplo, o Manifesto Antropófago de Oswald, que colaborou significativamente para a passagem de um pensamento “cultural” para um pensamento “contracultural”.
Para Lucien Sfez, a comunicação é a nova religião capaz de articular todos os saberes possíveis. Bem como Adriano Rodrigues afirma que com o surgimento do “campo dos média”, os campos deixaram de estar conectados com a religião, que os agregava, e passaram a ter como centro “universalizante” a comunicação. Oswald, nesse sentido, representa um pastor. Pois quem seria melhor para que possamos entender esses meios, senão o artista que é, ao mesmo tempo, meio e mensagem? Oswald é fruto desse meio e mensagem do meio, tem a capacidade de reunir pessoas em torno do seu trabalho, contemplando e pensando sobre suas ideias. Outro exemplo de artista que serve como meio para a disseminação do Modernismo é Tarcila do Amaral. Fica evidente sua capacidade de comover outrem quando ela mostra um quadro seu, chamado “A Negra”, a uma negra francesa, a qual fica instantaneamente estupefata ao se deparar com a pintura por reconhecer no quadro a figura de sua avó. Essa catarse da espectadora diante da bela arte está diretamente ligada à aura de que fala Walter Benjamin.
Os modernistas são contrários à dominação da Igreja. No filme, os padres se aproveitam da fé e exercem uma comunicação que persuade os fiéis, seja os extorquindo - como no caso das viúvas -, seja os doutrinando - como no caso dos índios. Segundo Adorno, isso seria a transformação dos bens simbólicos em mercadoria. A fé estaria, então, sendo transformada em mercadoria. Durante uma cena, por exemplo, alguém está abrindo os baús dos padres, os quais tentam impedir alegando que lá dentro não havia nada mais além de “instrumentos de disciplina”. Podemos relacionar essa situação à filosofia do Adriano Rodrigues, que diz que um campo desenvolve uma série de instrumentos pedagógicos para fazer as pessoas aderirem a ele.
Conforme Adriano Rodrigues, para um campo social poder se sobressair e se desenvolver, é necessário que seus rituais sejam expostos. O Modernismo, por seu turno, expôs intensamente os seus rituais no ambiente artístico e cultural da época e, assim, acabou tendo repercussão. Segundo Martino, estar infectado pela cultura é amplo, geral e irrestrito. De modo que quem é “infectado” precisa disseminar essa nova visão ou “vírus” e desbancar os movimentos existentes. Este último aspecto pode ser associado à crítica de Adriano que declara que a comunicação propõe o bom senso, uma política de interpretação, ou até mesmo a ironia de zombar das diversas teorias e do cenário da vida cotidiana. 
Em “O Homem do Pau-Brasil”, há um diálogo entre Rosa e os personagens que representam as personalidades do Oswald em que aquela vai dizer: “vocês precisam compreender a arte por suas causas materiais. O modernismo é o período alto do burguês no primeiro café valorizado. Feito por vocês, pessoas assim como café: de uma valorização toda artificial”. Seguindo a lógica do Adorno e da Indústria Cultural, toda a cultura transformou-se em produto, em mercadoria. Desse modo, o indivíduo também acaba se tornando uma mercadoria, e a cultura é absorvida de forma a se transformar em prestígio para o indivíduo, não em conhecimento. A figura masculina de Oswald responde: “Imagine. Nós, artistas anônimos na revolução!”. Tal resposta evidencia que a cultura começa a ser valorizada artificialmente, uma vez que o seu conteúdo deixa de ser o essencial e dá lugar à capacidade que ela tem de promoção do indivíduo.
Pelas dimensões analisadas aqui, e por outras tantas, a conclusão a que Vera França chegou parece ser cada vez mais pertinente: a modernidade não descobriu a comunicação, apenas a problematizou.

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Evoé
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segunda-feira, 9 de novembro de 2015

La mujer sin miedo - Eduardo Galeano

Vendo esse vídeo em que Eduardo Galeano lê "La mujer sin miedo" senti a vontade imensa de compartilhá-lo, lançando a toda(o)s a reflexão que traz esse texto do poeta uruguaio. 
Compartilho esse vídeo como forma de uma pequena homenagem às mulheres sem medo, que se conhecem, se respeitam e se valorizam. Para todas as mulheres que honram o empoderamento do feminino sem se fecharem para o mundo. Para todas que não permitiram que a insegurança de seus companheiros apagassem seus sonhos, o sorriso nos lábios e capacidade de amar.





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Evoé
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domingo, 8 de novembro de 2015

Renúncias

Renunciei o universo,
os céus,
as estrelas,
os deuses,
o vinho,
as posições políticas,
o egoísmo,
e anunciei o amor.

(Gabriel Silveira)


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Evoé
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quinta-feira, 5 de novembro de 2015

O Mestre dos Quebra-Cabeças



Betsy Carter é a autora de "Nothing to fall back on", que se tornou um best-seller. Em seu terceiro romance "O Mestre dos Quebra-Cabeças" é retratada a trajetória de Flora e suas irmãs que vão para os Estados Unidos fugindo da Alemanha Nazista, assim como a de Simon que quando criança foi mandado para NY pela família com a esperança de uma vida melhor. O livro conta a diversidade da vida do menino que sempre batalhou muito para poder se sustentar, uma vez que ele era uma criança sozinha. Simon consegue se tornar um empresário quando ele cria um jogo para ser vendido junto com lanches como brinde ele cria “o quebra cabeças”, Flora e Simon se casam, embora tenham uma vida agradável juntos, nas finanças, nem Simon nem Flora conseguem esquecer seus parentes e começam uma busca heroica para tentar salvar suas famílias. O livro não só conta a história de alguns judeus que sobrevivem à Alemanha Nazista, como mostra uma história com muita humanidade e a compaixão do casal por quem está sofrendo, descreve do ponto de vista dos judeus imigrantes dentro dos Estados Unidos o quanto eles sofrem os obstáculos que passam, mas sempre mostrando a coragem deles perante as adversidades. O que toca no livro também é o fato da história ter sido vivida pela família da autora, o que permite criar um laço com os personagens por sentir que são reais, assim como notar a riqueza de detalhes que ela coloca a personalidade. E também a pobreza de NY no início do século XX. Um livro que não só conta sobre personagens, mas que te faz viver os personagens, suas dores, seus anseios, sua fome, seu medo, sua saudade, um livro que mostra o potencial da escritora Betsy Carter.


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Evoé
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Sonoridade Elétrica

Poema presente no livro Mosaicos, de Michelle C. Buss, e interpretado pelo poeta e jornalista Guilherme Ziggy. Fecha os olhos para ouvir e se permita viver o poema ;)





Gosto da sonoridade elétrica
da palavra inglesa storm.
Sussurrada à meia voz,
storm tinge o céu com o lampejo de raios,
o rugido de trovões.
Conjura lendárias cantigas
de variações de ventos.
Água e Ar.
Um sopro crispa os céus,
o argento das nuvens,
molha a terra com rebeldia.
Água pura
Fecunda Terra


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Evoé
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quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Paquetá

Navegando naquelas águas tensas
Vales e cristas deixam o seu rastro
Meu coração suplica, eu me alastro,
Gozo, ignoro comoções detentas

Da proa, se vislumbra já a ilha
Não há carros, cavalos há nas ruas
Crianças brincam e mergulham nuas
Homens morenos guardam a baía

Voam gaivotas brancas e perenes
Pescadores se lançam em suas redes
Ao longe, ouve-se alguma canção

Quando cai a noite, rangem os gonzos
Se recolhem ou partem, meio zonzos
Os ilhados que habitam e os que são


Amanda Gomes



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Evoé
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