sexta-feira, 26 de setembro de 2014

O que você veria?


(madrugada de 31/05/2014) 

O que você veria, se hoje fosse seu último dia?
Nesse lugar, nessa Terra, bem aqui...

Acho que veria os seus sonhos
Seus verdadeiros amigos, e sua família

Veria a distância e o tempo de outra forma
E toda a beleza da Criação, bem aqui...

Veria a riqueza na simplicidade e, acredite
O Sol como se fosse a primeira vez...

Veria seus medos e culpas, todos
Transformados em sabedoria

Tudo aquilo que parecia tão distante
Tão perto, que você até tocaria

Passado, presente e futuro, num só
E certamente, você os uniria

Sentiria a batida do seu coração
E nele, todo um encanto e magia

Veria a vida como um carrossel
Em baixo e no alto, eu sei que você iria sorrir

Viriam as lágrimas, talvez
E assim, você entenderia melhor o que é a alegria

Olharia para o céu, nunca tão perto
E de verdade, você agradeceria

Compreendendo que Deus está em todo lugar
A tua Fé assim, renasceria

Quem sou eu? Quem eu seria?
A voz do teu coração, teu maior guia

Derrame seus dons onde estiver
Não passará duas vezes pelo mesmo caminho

Talvez você tenha uma longa jornada
E sei que vai se sair muito bem, eu sei...
Pois no final de tudo isso
Tua lembrança será de ternura
E, o mais importante
Vai voltar ao verdadeiro lar, sorrindo...
Por todas as minhas relações!

Mitacuye Oyasin!

(João-de-Barro)


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domingo, 21 de setembro de 2014

William S. Burroughs




Segue, abaixo, um texto de Marcelo Rezende publicado no caderno Ilustrada do jornal Folha de São Paulo do dia 29 de agosto de 1997 falando de William Burroughs. Acho que é um texto capaz de aguçar a curiosidade de quem ainda não conhece a obra deste grande experimentador da prosa americana. Logo após o texto vai um poema do cara. 

O príncipe negro da literatura sobrevive 
de Marcelo Rezende 

Para sempre, como uma condenação, um viciado. De William Burroughs, o romancista, ator, pintor, panfletário e poeta, morto no último dia 2 de agosto, aos 83 anos, a mídia de língua inglesa se lembrará assim.
No lugar do aventureiro, o heroinômano. Ocupando o espaço do cultor da prosa experimental, "reinventor" da ficção científica e herdeiro exaltado do surrealismo, o consumidor compulsivo de haxixe no Marrocos, de cannabis no México ou de anfetamina na ensolarada -- para ele quase nunca a luz -- costa da Califórnia.
''Junky'' ("Drogado") é então menos um romance, um relato e uma memória, mas, antes, uma carta de intenções de quem, pelas escolhas da prosa e da vida, tem a extrema pretensão de não caber no Ocidente.
O ano é 1953, em uma década de grandes acontecimentos. Burroughs já havia matado sua mulher com um tiro, alegando ter sido um acidente infeliz. Morre também, com o caso, os restos de sua heterossexualidade relutante. Até o fim, amará apenas meninos.
O livro é então caçado e proibido, pois a ninguém interessa a história de um homem que rouba, mente e ataca em nome do vício para, no final, aprender ser a vida o acúmulo de casos sem sentido, decretando que uma moral só é possível em fábulas infantis.
Não é um gênio. Não é o melhor nem mesmo o único. Seguem seu rastro o poeta Allen Ginsberg (1926-1997) e o romancista Jack Kerouac (1922-1969). São a ''beat generation'' e estão infelizes com os EUA da opulência do pós-guerra e da idéia de uma vida correta. Um desconforto que pretende oferecer alternativas aos que não se ajustam aos bons costumes.
Mas tudo se dissolve nos anos 60. Há agora contracultura, Beatles, maio de 68 e LSD. Ele sabe que não dará certo. É impossível, parece-lhe. O mundo está condenado ao inferno da ditadura infeliz da classe média, ou do totalitarismo, pensa em Paris, Londres ou na selva latino-americana.
Prevê doenças assassinas. Espera o dia em que os governos possam controlar a mente de seus cidadãos, pois para Burroughs a linguagem é um vírus.
Passa então dias errando pelo deserto com uma espingarda, atirando para o alto. Burroughs, o paranóico. O ''Noam Chomsky do submundo''. O admirado e pouco lido ''príncipe negro'' da literatura norte-americana.
Mas sobrevive. Atravessa as décadas e assiste a um show de oportunismo com seu nome. Escreverá ''The Western Lands'' (1987), outra obra máxima após ''Almoço Nu'' (1959), e outras tantas, sempre lançadas em silêncio, seguirão depois.
É fotografado ao lado de bandas de rock, cantores de rap, cineastas e artistas performáticos. Sorri para a imprensa e ensina aos novatos a arte da dissimulação. Aparece na TV de seu país em um comercial para uma marca japonesa de tênis. A frase, na tela, é profética: ''Eu acredito em alta tecnologia''.
Sobre seu rosto, uma sucessão de imagens da história do homem no século 20. A Segunda Guerra Mundial, a chegada à Lua. Burroughs com um terno negro e um chapéu. Uma figura sinistra.
Pouco antes da morte, dizia adorar apenas os gatos que circulavam por sua casa e pensava profundamente sobre caviar.
Sentia horror por uma sociedade que criava estado policial para controlar o desejo de fumar um cigarro no trabalho, bar e restaurante. Duvidava da qualidade da vida. Tinha fé apenas em si mesmo.



dia de ação de graças, 28 de novembro de 1986
agradeço pelo peru selvagem e os pombos passageiros, destinados a virar merda nas saudáveis tripas americanas.
agradeço por um continente a espoliar e envenenar.
agradeço pelos índios por garantirem uma módica dose de desafio e perigo.
agradeço pelas vastas manadas de bisões para matar e depelar e depois deixar as suas carcaças à putrefação.
agradeço pelos troféus de caça de lobos e coiotes.
agradeço pelo sonho americano, por inventar lorotas até que elas brilhem à luz do dia.
agradeço pela klu klux klan. aos policiais que matam negros e os contabilizam. às decentes beatas de igreja com suas mesquinhas, interesseiras, feias e perversas caras.
agradeço pelos adesivos de “mate uma bicha em nome de jesus cristo".
agradeço pela aids de laboratório.
agradeço pela proibição e pela guerra contra as drogas.
agradeço por um país onde a ninguém é permitido cuidar da seus próprios problemas.
agradeço por uma nação de dedos-duros.
agradeço, sim, todas as lembranças – ok, deixa eu ver o que você tem nas mãos!
você foi sempre uma dor de cabeça e uma encheção de saco.
agradeço pela última e maior traição do último e maior sonho dos sonhos humanos.

(tradução de Leo Gonçalves)


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domingo, 14 de setembro de 2014

Pelada Poética no Leme

Quarta passada tive a alegria de participar da Pelada Poética no Leme, na cidade do Rio de Janeiro, bem no iniciozinho da praia de Copacabana. A convite do poeta e colega de editora, Marcos Bassini, tive a oportunidade de conhecer a poesia carioca. Foi uma experiência marcante e surpreendente. A poesia do Rio de Janeiro é cheia de cores, é uma poesia forte, intensa, é uma poesia com tons de verão e bastante musical. Os cariocas tem um certa leveza e uma intimidade secreta com a poesia, é lindo de ver e, especialmente, de ouvir.
Nessa oportunidade, também conheci o ator e poeta, Eduardo Tornaghi, e o autor do blog Poema Diário, Daniel Russell Ribas, que rendeu boas conversas e troca de aprendizado. Claro, aproveitei ainda para compartilhar um pouco dos poemas do Mosaicos. E por fim (pena que teve fim!), trouxe para Porto Alegre o Senhorita K, do Bassini, e deixei com ele o meu Mosaicos. 
Foi uma experiência linda! Ainda quero ir em muitos saraus da Pelada Poética no Leme!

Fotografia: Clara Állyegra Lyra Petter

Fotografia: Clara Állyegra Lyra Petter


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quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Attila József



Foi um poeta húngaro que nasceu em 11 de abril de 1905, em Budapeste, Hungria, e morreu em 3 de dezembro de 1937, em Balatonszárszó.
Filho de mãe lavadeira e pai operário da indústria de sabões, Jószef publicou pela primeira vez seus poemas quando tinha apenas dezessete anos.
Tendo adotado o marxismo como ideologia (inclusive filiando-se ao Partido Comunista) em sua poesia retrata com intimidade a vida do proletariado. A luta pela justiça social foi extremamente marcante em sua vida e obra. Ao mesmo tempo – como não podia deixar de ser, pela proximidade com que viveu com a solidão e a miséria – seus versos são marcados por uma densa melancolia.
Imerso em profunda depressão e atormentado pela esquizofrenia, Attila Jószef se atirou sob um trem de carga aos 32 anos de idade, deixando uma obra brilhante e original, ainda pouco difundida no Brasil.
Segue a tradução de dois dos seus poemas:

DIZEM (trad. Egito Gonçalves)

Quando nasci tinha uma faca na mão.
Dizem: é poesia.
Mas peguei na pena, melhor ainda que a faca.
Nasci para ser homem.


Alguém soluça uma felicidade apaixonada.
Dizem: é amor.
Chama-se ao teu seio, simplicidade das lágrimas!
Só contigo eu brinco.


Não recordo nada e também nada esqueço.
Dizem: como é possível?
O que deixo cair mantém-se sobre a terra.
Se o não encontro, tu o encontrarás.


A terra me aprisiona, o mar me dilacera.
Dizem: um dia morrerás.
Mas dizem-se tantas coisas a um homem
que nem sequer respondo.

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CORAÇÃO LEVE (trad. Nelson Ascher)

Não tenho pai nem mãe
nem deus nem pátria-amada
nem berço nem caixão
nem beijo ou namorada.

Há três dias não como
nem muito ou mesmo pouco.
Meus vinte anos são tudo;
meus vinte vendo ou troco.

Caso ninguém os queira,
o diabo que os arrende.
meu coração nem pesa
se roubo ou mato gente.

Sou preso, executado,
no chão santo acolhido
e erva letal recobre
meu coração garrido.




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